Postagens

[Poema] Sonho

Imagem
Tudo que sonho é sonho Um sonho caro de se pagar Pois não há quem o possa requerer A não ser eu. Sonho e sonho só No anelo oco de ser o que não sou. No sonho sou mais que muralhas Sou mais que limites, mais que grilhões. Sou tal qual Peter Pan Garoto perdido que pode voar. Sou desgarrado. Um vírus, bactéria mutável. Em sonhos é irreal o impossível Tudo se torna laboriosamente tangível . Na caldeira o corpo se lança A alma pequena ante isso dança Num redemoinho complexo Corpo e alma desconexos. Como disse Fernando Em palavras do meu feitio: O meu mar dá-me saudade Do mar alheio. O mar que vejo todo dia Cujo horizonte é pouco Faz-me sentir saudades Dos mares que nunca verei. Passado? Quem não o tem atire a priori Passado de honra ou desonroso? Sem virtude ou virtuoso? O círculo vicioso O rabo na boca. São quimeras, deveras sandices Príncipes em vãs cavalgadas Tristeza e covardia emparelhadas São momentos meus de criancice. Um sonho é tudo que resta. Abram minha mente Estuprem meus...

[Conto] Sentimentos

Imagem
Capítulo 1 Minha irmã, mais velha que eu, iria se casar. Isso punha a casa em polvorosa. Minha mãe vivia descabelada, meu pai somava as dívidas que faria alugando o espaço para a festa, o aluguel do vestido de noiva, o buffet, os ternos... E nisso ninguém me percebia. O mundo naquele momento girava em torno do casamento da primogênita, Gleice. Eles todos corriam em forward, enquanto eu em slow. O que podia aproveitar como algo bom de tudo aquilo era o fato de poder andar livremente pela casa sem ter que ouvir as piadinhas sem graça que Gleice proferia. Ela não perdia a oportunidade de gracejar de mim. Riu quando fiz o bigode pela primeira vez, ou quando leu meu primeiro poema. Não era para ninguém especial, mas ela mostrou para minha mãe dizendo que eu havia feito para uma garota e que estava apaixonado. Na verdade eu fiz aquele poema para uma personagem de um livro, nada demais. No dia do casamento... Era uma tarde ensolarada de primavera onde pássaros cantavam e flo...

[Poema] À Procura

Imagem
Alguém, com cuidado, pode me dizer O que do mundo físico se leva Desprovido de muita coisa perder Riscos, dores, dúvidas, espera? Pode me falar sem tartamudear Parágrafos prontos ou frases feitas Por um preço barato, que possa parcelar Algo em que minha alma deleita? Que não seja sonho, quimera, fantasia Mas algo tangível, calmante em demasia Que me satisfaça como uma amante Que me tire o fôlego, deixe-me arfante. Não pode ser ou pode por imposição Sem pudor, levar aos céus e ao chão Concomitantemente, seja odioso E não abdique de ser amoroso. Que seja o doce ou o amargoso fel Que seja algo nobre, altivo e tolerante E belo como uma pintura de Rafael Precioso e soberbo como um diamante. Não quero sol, lua, satélites, universo Estrelas mortas ou anãs perdidas Quero que minha amada, só esteja perto E adjacente pelo resquício da vida.

[Poema] Parede de Fogo

Imagem
A gente pensa que pode tudo Que se quiser de fato tem o mundo Não se toca que tem à frente Uma imensa parede de fogo. Tem vezes que sonho que posso voar Sem querer abro os braços, sinto planar De olhos cerrados, o vento no rosto. Aquela sensação de liberdade Que nos faz querer algo além Que o impossível está logo ali Se ninguém disser que é impossível Eu posso ir lá realizar. Como criança sem se importar Que tudo pode ser, alcançar Uma sensibilidade à flor da pele Uma abertura para o universo. Eu crio o mundo com minhas cores Apago com a borracha aquelas dores Que o tempo trouxe num momento ruim Eu creio que lá é melhor pra mim. Mas eu vejo esse muro alto Flamejando, sempre aceso De um lado ao outro, imenso Lembrando-me que a realidade é árdua. 

[Poema] O Garoto

Imagem
Onde estão os livros que escrevi? Onde foram parar as poesias que ensaiei? E os sonhos que na juventude nutri? O que poderia ser jamais saberei. Era um garoto dividido em si Tranqüilo e tímido Covarde, nunca entendi Jogava com os sentidos, Mas sabia o que era o bem. Pensava em ser escritor Criar personagens e coisas afins Expressar bem alegria e dor Mas nunca conseguia chegar ao fim. Depois de um tempo... A poesia veio numa fase primaveril Não sabia que existia em minha mente Achava-a um tanto quanto pueril Entretanto já era a semente. Na sala de aula aflorou Palavras e rimas saíam aos montes Jorravam versos de conflito e amor Pensei que nunca iria secar a fonte. Porém secou, por um momento achei Que era tolo e ninguém leria Páginas e páginas nas chamas queimei Doravante a poesia escrita morria. Revoltei-me com afinco contra mim Não havia sentido viver a vida Quis por um termo enfim Rasgar de vez do meu peito a ferida. Queria morrer, sem entender o processo Alguma coisa dentro ...

[Poema] A Rosa

Imagem
E o que em demasia me pesa conhecer Foi o que despendi correndo atrás do vento Quando a rosa que seguia no momento Tinha uma fortuna avessa à minha. Lamento a sucessão das ocasiões Em que meus interesses passionais Dedicavam-se a cultivar uma rosa Que não queria do meu modo vingar. Não era para mim o fruto daquele roseiral O perfume e a beleza pertenciam a outro O futuro pungente de ciúmes me alimentou Esta infame força malquista fez-me marionete E dia sobre dia constante me secava as forças Planejando uma conclusão para a situação. Meu forte juízo por vezes quis quebrar o feitiço Porém a rosa chamativa, das minhas retinas objeto Cegava-me o derredor, retirava-me sutil o viço Destilava, sem piedade ou respeito, o nocivo fel Quando, na verdade, desejava de seus lábios o mel. E o dono dessa flor, com direitos a seu favor Lançou sobre mim a seta da distância Coisa tal não tolerei, afastar-me da preciosa. Deixar facilmente minha sedutora rosa E com infame acesso repentino de fúria Atin...

[Conto] O Lago

Imagem
Quando eu tinha oito anos, meu irmão mais velho disse que quando a gente morre nossa alma ficava presa no lago que ficava em frente à nossa casa. Eu sempre ficava admirando o lago. Que segredos havia lá no fundo? O que os mortos tinham para fazer lá? Será que eles comiam os peixes? Será que algum pescador um dia fisgara uma alma? Eu vivia assustado com a possibilidade de encontrar algum fugitivo do lago. Quem sabe ele não buscaria vingança e a primeira pessoa que estivesse a passar ele pegasse como culpado, como se fosse um juiz em busca da justiça? Mas talvez ele julgasse errado e nem percebesse. Ou então estar morto significasse a perda da consciência e não poder discernir o que era certo do que era errado. Eram medos pueris. Mas nunca pus os pés nas águas daquele lago. Porém chegou um dia em que o encarei como se quisesse que ele devolvesse o que não lhe pertencia: meu irmão. Lucas morrera atropelado no dia em que completava 15 anos. Eu tinha meus 11. Era meu único irmão. Chorei a...