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Mostrando postagens de setembro, 2011

[Poema] Sonho

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Tudo que sonho é sonho Um sonho caro de se pagar Pois não há quem o possa requerer A não ser eu. Sonho e sonho só No anelo oco de ser o que não sou. No sonho sou mais que muralhas Sou mais que limites, mais que grilhões. Sou tal qual Peter Pan Garoto perdido que pode voar. Sou desgarrado. Um vírus, bactéria mutável. Em sonhos é irreal o impossível Tudo se torna laboriosamente tangível . Na caldeira o corpo se lança A alma pequena ante isso dança Num redemoinho complexo Corpo e alma desconexos. Como disse Fernando Em palavras do meu feitio: O meu mar dá-me saudade Do mar alheio. O mar que vejo todo dia Cujo horizonte é pouco Faz-me sentir saudades Dos mares que nunca verei. Passado? Quem não o tem atire a priori Passado de honra ou desonroso? Sem virtude ou virtuoso? O círculo vicioso O rabo na boca. São quimeras, deveras sandices Príncipes em vãs cavalgadas Tristeza e covardia emparelhadas São momentos meus de criancice. Um sonho é tudo que resta. Abram minha mente Estuprem meus...

[Conto] Sentimentos

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Capítulo 1 Minha irmã, mais velha que eu, iria se casar. Isso punha a casa em polvorosa. Minha mãe vivia descabelada, meu pai somava as dívidas que faria alugando o espaço para a festa, o aluguel do vestido de noiva, o buffet, os ternos... E nisso ninguém me percebia. O mundo naquele momento girava em torno do casamento da primogênita, Gleice. Eles todos corriam em forward, enquanto eu em slow. O que podia aproveitar como algo bom de tudo aquilo era o fato de poder andar livremente pela casa sem ter que ouvir as piadinhas sem graça que Gleice proferia. Ela não perdia a oportunidade de gracejar de mim. Riu quando fiz o bigode pela primeira vez, ou quando leu meu primeiro poema. Não era para ninguém especial, mas ela mostrou para minha mãe dizendo que eu havia feito para uma garota e que estava apaixonado. Na verdade eu fiz aquele poema para uma personagem de um livro, nada demais. No dia do casamento... Era uma tarde ensolarada de primavera onde pássaros cantavam e flo...

[Poema] À Procura

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Alguém, com cuidado, pode me dizer O que do mundo físico se leva Desprovido de muita coisa perder Riscos, dores, dúvidas, espera? Pode me falar sem tartamudear Parágrafos prontos ou frases feitas Por um preço barato, que possa parcelar Algo em que minha alma deleita? Que não seja sonho, quimera, fantasia Mas algo tangível, calmante em demasia Que me satisfaça como uma amante Que me tire o fôlego, deixe-me arfante. Não pode ser ou pode por imposição Sem pudor, levar aos céus e ao chão Concomitantemente, seja odioso E não abdique de ser amoroso. Que seja o doce ou o amargoso fel Que seja algo nobre, altivo e tolerante E belo como uma pintura de Rafael Precioso e soberbo como um diamante. Não quero sol, lua, satélites, universo Estrelas mortas ou anãs perdidas Quero que minha amada, só esteja perto E adjacente pelo resquício da vida.

[Poema] Parede de Fogo

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A gente pensa que pode tudo Que se quiser de fato tem o mundo Não se toca que tem à frente Uma imensa parede de fogo. Tem vezes que sonho que posso voar Sem querer abro os braços, sinto planar De olhos cerrados, o vento no rosto. Aquela sensação de liberdade Que nos faz querer algo além Que o impossível está logo ali Se ninguém disser que é impossível Eu posso ir lá realizar. Como criança sem se importar Que tudo pode ser, alcançar Uma sensibilidade à flor da pele Uma abertura para o universo. Eu crio o mundo com minhas cores Apago com a borracha aquelas dores Que o tempo trouxe num momento ruim Eu creio que lá é melhor pra mim. Mas eu vejo esse muro alto Flamejando, sempre aceso De um lado ao outro, imenso Lembrando-me que a realidade é árdua. 

[Poema] O Garoto

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Onde estão os livros que escrevi? Onde foram parar as poesias que ensaiei? E os sonhos que na juventude nutri? O que poderia ser jamais saberei. Era um garoto dividido em si Tranqüilo e tímido Covarde, nunca entendi Jogava com os sentidos, Mas sabia o que era o bem. Pensava em ser escritor Criar personagens e coisas afins Expressar bem alegria e dor Mas nunca conseguia chegar ao fim. Depois de um tempo... A poesia veio numa fase primaveril Não sabia que existia em minha mente Achava-a um tanto quanto pueril Entretanto já era a semente. Na sala de aula aflorou Palavras e rimas saíam aos montes Jorravam versos de conflito e amor Pensei que nunca iria secar a fonte. Porém secou, por um momento achei Que era tolo e ninguém leria Páginas e páginas nas chamas queimei Doravante a poesia escrita morria. Revoltei-me com afinco contra mim Não havia sentido viver a vida Quis por um termo enfim Rasgar de vez do meu peito a ferida. Queria morrer, sem entender o processo Alguma coisa dentro ...

[Poema] A Rosa

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E o que em demasia me pesa conhecer Foi o que despendi correndo atrás do vento Quando a rosa que seguia no momento Tinha uma fortuna avessa à minha. Lamento a sucessão das ocasiões Em que meus interesses passionais Dedicavam-se a cultivar uma rosa Que não queria do meu modo vingar. Não era para mim o fruto daquele roseiral O perfume e a beleza pertenciam a outro O futuro pungente de ciúmes me alimentou Esta infame força malquista fez-me marionete E dia sobre dia constante me secava as forças Planejando uma conclusão para a situação. Meu forte juízo por vezes quis quebrar o feitiço Porém a rosa chamativa, das minhas retinas objeto Cegava-me o derredor, retirava-me sutil o viço Destilava, sem piedade ou respeito, o nocivo fel Quando, na verdade, desejava de seus lábios o mel. E o dono dessa flor, com direitos a seu favor Lançou sobre mim a seta da distância Coisa tal não tolerei, afastar-me da preciosa. Deixar facilmente minha sedutora rosa E com infame acesso repentino de fúria Atin...

[Conto] O Lago

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Quando eu tinha oito anos, meu irmão mais velho disse que quando a gente morre nossa alma ficava presa no lago que ficava em frente à nossa casa. Eu sempre ficava admirando o lago. Que segredos havia lá no fundo? O que os mortos tinham para fazer lá? Será que eles comiam os peixes? Será que algum pescador um dia fisgara uma alma? Eu vivia assustado com a possibilidade de encontrar algum fugitivo do lago. Quem sabe ele não buscaria vingança e a primeira pessoa que estivesse a passar ele pegasse como culpado, como se fosse um juiz em busca da justiça? Mas talvez ele julgasse errado e nem percebesse. Ou então estar morto significasse a perda da consciência e não poder discernir o que era certo do que era errado. Eram medos pueris. Mas nunca pus os pés nas águas daquele lago. Porém chegou um dia em que o encarei como se quisesse que ele devolvesse o que não lhe pertencia: meu irmão. Lucas morrera atropelado no dia em que completava 15 anos. Eu tinha meus 11. Era meu único irmão. Chorei a...

[Conto] O Último Conto

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Capítulo 1 Uma das coisas que Marcelo menos gostava era ter que escrever sobre algo com um tema definido. Trabalhar no jornal da cidade lhe cortava as asas da imaginação. Alguns escritores da redação, já mais andados, podiam escrever sobre o que quisessem. Não havia reunião às 17h para definir o tema da semana para eles. Entretanto para Marcelo não havia essas regalias. Sempre lhe davam temas fúteis, coisas que não faziam o menor sentido escrever, coisas tão banais que ele se perguntava porque ainda estava ali. Por que manter-se num lugar que não parece ter sido feito para você, onde não é bem visto? Suas armas afiadas nunca poderiam ser utilizadas, não estava lhe parecendo muito proveitoso manter-se ali. Quando chegou à sua casa, no fim daquele dia, ligou o note, mas a tela que via não aparentava outra coisa senão sua branquidão de vazio. Olhava o tema impresso à sua direita, mas nada lhe era enviado às mãos, para que digitassem. Foi à cozinha, abriu a porta da geladeira e destacou ...

[Poema] A Garota Andante

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Loucura é uma palavra constante Nesses diálogos perdidos no tempo Parece que já te conhecia Mas você a mim ainda não. Tratei logo de te enredar Te chamar para perto do fogo Você se debateu, bateu, zangou Mas aos poucos se entregou. Não quero tomar nada de você Que não seja dado com vontade Mas tratei como objetivo Te trazer felicidade... Andando sempre por aí Errante em outros lugares Te trouxe para meu mundo Para que respirasse outros ares. Vivia a andar por aí Mas agora só não está Vivia entre aqui e ali Mas agora comigo pode contar.

[Poema] Amo-te

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Vejo-te distante, e só por um instante você me percebe. Percebe meu jeito, olhar indeciso, não paro ou concluo... E não sei se estou certo, prossigo aflito só te olhando, Mas você altera o destino do olhar e se vai andando. Na sala de aula, você não me nota, porém estou perto. Ao lado, distante do mundo, de tudo, mas não de você. A aula começa, não ouço palavras, senão as não ditas, Que você me permite criar, são só as que posso ler. Teu riso, teu jeito, tão simples, meu anjo, é singelo. Embriaga-me, alegra-me, é tal que ao fim me felicita. Deixa-me em transe, e as pernas um tanto trêmulas, Um frio na barriga, um suor nas mãos, que me incita. É diferente, nunca sentira isso antes, então só observo. Mas lá dentro, no âmago do meu ser, não me agüento. Imagino nós dois a sós, e nisso desviar minhas retinas Pairadas em ti, linda, contra minha vontade, eu tento. A aula termina, e então vagarosamente você se levanta. A tua fragrância vem, os cabelos ao vento me encantam E em frases sucin...

[Poema] Perdi-me

Perdi-me quando me deixei Onde outrora não era eu o inquilino. Traí-me quando vi nos flancos Mãos que me abraçavam dizer: - Não quero mais. Fugi para lugar nenhum, Onde nunca estivera, e senti frio. Pensei que o vigor que me acompanhava Fosse o necessário para o meu retorno, eu pensava. Lamentei entender que um dia o caçador vira caça. E ver nascer no sol uma dor que era minha. Todavia não compartilhar foi meu refúgio, Arredio, mesquinho, solução. Tornei-me algo que nunca pensei poder ser. Usado. Jogado fora como uma latinha vazia de refrigerante. Como se aquela que me dizia palavras de amor, De um momento para o outro se tornasse pra mim Uma completa estranha. Perdi-me. A estabilidade do meu mundo tremera Como se um terremoto o chacoalhasse. Meu coração tornou-se um alvo Qualquer um poderia atirar um flecha envenenada, E me fazer sucumbir certamente. Temi não saber quem era nem o que fora. Temi saber que tudo o que tinha dado a ela, Nada era. Chorei, dias e dias a fio, procurando...

Projeto de um Livro: Perinos

Capítulo 1 O cortejo fúnebre cortava a cidade, atraindo olhares melancólicos e curiosos. As carpideiras efeutavam seu trabalho com maestria. Choros longos e constantes criando até uma certa melodia gostosa com os tons diferentes que cada uma emitia. Praticamente uma ópera. Os participantes caminhavam com seus óculos escuros, segurando as mãos daqueles que não conseguiam reprimir suas dores. Abraçando aqueles mais fingidos que estavam loucos para representar um desmaio. Porém ninguém de fato se atreveu a isso. Ninguém intentava roubar a cena do morto, a última cena dele não poderia ser perturbada por um desmaio fajuto. Muitos aparentemente traduziam em suas bocas e trejeitos o respeito que se devia ao patriarca da família Mendes. Nessas horas todo morto é santo, seus pecados são lavados e ninguém ousa falar mal. Apesar de discordarem em conversas de boteco sobre a mão de ferro com que Bartolomeu Mendes regia sua cidade, neste momento eram coniventes com a caminhada dolorosa. Era o ú...